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181- 06) God Save The River Of The Queen

Acordamos com a missão de encontrar um Post Office pra despachar os postais para o Brasil e para o Japão.

Enviar postais para mim é algo sagrado.
É documento mais importante que passaporte.
É o registro carimbado de que vc realmente passou por aquele lugar e se lembrou de alguém especial.

O postal traz boas novas.
Chega antes de regressarmos.

As pessoas, em tempos virtuais, esqueceram-se da magia que é enviar e receber um postal.

Pra quem envia: um fôlego durante a viagem, uma breve retrospectiva em poucas linhas.
Pra quem recebe: um abraço distante, uma rápida amostra de prazer e satisfação.

Cada vez mais mandamos menos postais.
Cada vez mais perdemos a nossa caligrafia e com ela todos os nossos sentimentos desenhados.

Faço questão de manter isso vivo quando viajo.

Para os que viram meu pedido a tempo no blog, tiveram seus postais devidamente enviados…
Gostaria de ter mandado muitos outros, mas Santo Deus, como este hábito é caro!

Hoje, o dia se dividiria entre a residência oficial da monarquia britânica em Londres e a navegação pelo Rio Tâmisa até o Meridiano de Greenwich (último dia útil em Londres num próximo post).

Chegar aos portões da rainha é obrigatório para quem está visitando a cidade britânica.

Atravessamos o parque verdinho e nos divertimos com os pequenos esquilos nada tímidos, até encontrarmos o Palácio de Buckingham.

Engraçado como o palácio que a gente imagina é bem diferente do que palácio que a gente encontra.
Passamos a vida toda fantasiando tanto com o fato de que não é sempre que conhecemos a moradia de um monarca vivo, que estar ali, tão pertinho daquela família que tanto vemos pelos jornais e tv parece mentira.

Londres é um lugar cinematográfico, mas a região de Buckingham não é tão cheia de fantasia como eu imaginava que fosse. É mais real do que a realeza de contos de fada.

A começar pela troca da guarda real. É algo raro de ser ver.
O único artista que queríamos fotografar estava bem longe do nosso contato.

Se não tem tu, vai tu mesmo.

Brasileiros sempre dão um jeitinho de espalhar um pouquinho de simpatia.
Não foi muito difícil conseguir convencer o tiozinho.

É. É bacana tirar a foto nos portões da rainha.
É frustrante também compreender que vc é bem-vindo até ali.
Dali não passarás!

É interessante perder um pouquinho de tempo nos arredores dos portões do palácio.
Vc vê o movimento de súditos, digo, funcionários entrando e saindo… Carros espetaculares com vidros insufilmados entrando e saindo…

Nenhuma realeza aparece na janela para um tchauzinho. Hehehe…

Eu bem que tentei…
Resisti bravamente…

Eu nem queria uma foto minha nos portões…
Mas estamos ali, oras bolas… Não vamos voltar tão cedo…

Fora que eu me apaixonei pelas estátuas.
Principalmente a da enorme senhora e seu leão.

Claro que era impossível não se maravilhar com os anjos do Victoria Memorial.

Atravessamos uma das avenidas mais bonitas que eu já vi na minha vida, a Constituition Hill.
Os táxis negros deslizavam por aquele asfalto colorido.

Atravessei a rua com uma idéia.

A Ju foi junto.

Eu queria andar até o final dessa avenida.
Não sabia o que encontraria, mas falei pra Ju: “- Vamos e contornamos o palácio”.

E fomos.
Encontramos um caminho ainda mais bonito.

O caminho era um convite para um passeio irrecusável.

As frondosas árvores abraçavam-se uma às outras formando um teto verde.
Várias vezes eu esquecia que estava na ciclovia e a Ju me lembrava de abrir caminho…

Como é bom lembrar dessa caminhada.
Encontramos o Arco de Wellington. Vimos a estação de Metrô Hyde Park Corner, mas continuamos…

Contornamos o palácio.
A cada portão, muitos pensamentos e sensações.
Imaginar morar numa cidade de rainhas e príncipes é um ótimo exercício de brasilidade.

Seguimos pela Grosvenor Pl, reparando nos inacreditáveis casarões que tinham como nobre vizinha a rainha da Inglaterra.

A cidade ao redor dos muros reais era barulhenta, colorida, caótica e espetacular.
A rotina maluca de uma realidade contrastando com aquela dimensão fortificada, tão protegida dos olhos humanos.

Encontramos a estação Victoria, mas antes de tomarmos o metrô, fizemos uma bela compra de perfumes numa lojinha super baratinha e simples.
Burberry Touch de 100ml por preço de batatinha frita, a Jú comprou o frutífero adocidado da Britney Spears, dois Burberry amarelinhos femininos… Esqueçam Paris! Se comprar eletrônicos em Londres era bom negócio, comprar perfumes também era! Fizemos a festa.
A atendente, uma negra simpaticíssima, conversou tanto com a gente que nos encheu de presentes, amostras e brindes. Saimos de lá carregados e ainda por cima eu ganhei uma descolada mochila da caveirinha motoqueira, que iria me acompanhar pelo resto da viagem.

Não perdemos tempo.
Fomos direto para o lugar que mais adorávamos: Westminster.

Precisávamos explorar a Abadia de Westminster.

Encontramos a igreja Saint Margareth’s.

Ok. Linda!

Não resistimos mesmo a imponente torre do Parlamento do Reino Unido.

Não a torre do Big Ben, (e não vão pensar que o Big Ben é o famoso relógio do Parlamento Inglês, nem tampouco sua torre) – É o nome do sino, que pesa 13 toneladas e foi instalado no Palácio de Westminster. O nome do relógio é Tower Clock, e é muito conhecido pela sua precisão e tamanho.
Não resistimos à outra torre. A que fica do outro lado.

É absurdamente alta. Não há como capturar com os olhos todos os detalhes que decoram aquela torre.
Too much information!

Recortamos um parque cheio de crianças jogando futebol com a torre ao fundo.

Foi quando a chuva apertou.
Estávamos loucos para ir a London Eye, mas com chuva não seria tão bacana.

Pensamos em navegar primeiro pelo Tâmisa, já que a catamarã era fechada.
Escolhemos o destino mais longo: Greenwich.

Compramos nossos tickets nas docas.

Ficamos sentados numa plataforma que dançava ao balanço das águas.

Nossa catamarã não tardou a chegar.
A chuva havia realmente se intensificado. A correnteza estava forte.

Viajar pelo Tâmisa foi uma pausa para nossas inflamadas pernas.
Deixar-se levar pelo balanço do rio era tudo o que eu precisava pra relaxar.

Navegávamos enquanto petiscávamos alguma coisa no bar.
O capitão nos situava a cada ponte que cruzávamos.
Desde a Millenium Bridge a Tower Bridge.

A chuva deu uma trégua, mas o frio era intenso e o vento dentro do rio cortava a pele.
Eu já havia navegado num lago em Bariloche com chuva pior e frio muito mais penetrante, mas talvez fosse a canseira, realmente não dava pra ficar muito tempo ali.

A viagem não é curta. Nem bem havíamos começado a navegar e já estávamos decididos que sacrificaríamos o ticket de volta para retornar de trem ou metrô.

Chegamos numa Greenwich debaixo de uma forte chuva.
Foi quando eu vi uma plaquinha do Royal Observatory e tive certeza do que fazer em seguida. Mas isso já é outro post.

180- 05) Knights At Night

Já estávamos ficando familiarizados em descer na estação Westminster e encontrar aquela atmosfera amigável.

A escuridão deixava a cidade mágica.
Havia um convite irrecusável no ar.

Eu havia realmente me apaixonado pela cidade de Londres.
Andar por aquelas ruas caprichadas, com aquele vento gelando o rosto, compartilhando sonhos e admirações com os demais turistas que passavam boquiabertos pela nossa frente trazia liberdade, enchia o coração de uma felicidade que eu nunca havia sentido.

Eu já estava saudoso antes mesmo de ter minhas pegadas apagadas daquele chão.
Eu já sentia falta de Londres antes mesmo de deixá-la.

Captava sons, cheiros e luzes.
Caminhava por caminhos e passagens secretas que mexeriam com meus sonhos num futuro qualquer.

Ruas e túneis, escadarias e passarelas que mexiam com o meu labirinto e gravavam as mais fantásticas recordações no meu coração.

Não resistíamos ao Big Ben.
Já não era a primeira vez que subíamos as escadas da Westminster Tube Station e dávamos de cara com aquela enorme torre.
Já não era a primeira e muito menos a segunda vez e, ainda assim, sentíamos aquele adorável sentimento de descoberta, que faz a gente procurar o final da torre para encontrar os ponteiros precisos do famoso relógio.

Ficar pela região do rio era uma prova de fogo, ou melhor, de gelo!
Naquela hora da noite, daquele lado de lá, era preciso ter sangue quente, ou melhor, frio, para suportar ou se fingir de sapo.
Enfrentar aquela gélida corrente de ar que por ali existia não era tarefa para muitos cavaleiros.

Parar no meio da Ponte de Westminster e ter um momento de reflexão, do que tudo isso significa, do quanto estamos distantes de casa, do tanto que lutamos por este momento, mesmo sem saber que ele seria tão especial… É algo que mesmo agora, do lado de fora da foto, sentado em minha velha cadeira, digitando aqui nesse computador, eu não poderia compreender.
É tão completa a experiência em fazer parte de um lugar tão importante e ao mesmo tempo tão gigante que por um momento me perco em pensamentos indescritíveis.

Estava eu ali, olhando para mim mesmo e nem havia me dado conta!
Claro que eu não me enxergava.
Mas óbvio que eu me vejo agora.

Somos tão pequenos e frágeis se comparados ao concreto e aos tijolos que recheiam e envolvem todas essas estruturas, ao mesmo tempo que somos tão capazes de modelá-las a nossa vontade.
Somos gigantes quando estamos fora da foto, olhando por cima algo que ficou no passado.

Nem havia me tocado que o ambiente atrás de mim havia mudado suas luzes para se adequar a minha vibração colorida.

Uma pequena fração de cores similares.

Um segundo atrás estava com cores similares. No outro, já havia mudado.

Olhamos para a London Eye com respeito.
Tem coisas que os homens constróem e tiram o nosso fôlego.
Essa era uma delas.

Refletida no Tamisa, a London Eye ou o Olho de Londres era ainda mais bela. Uma declaração luminosa aos nossos desprotegidos olhos gelados.
Certamente subiríamos nela no dia seguinte não fosse pela nossa úmida aventura pelo Meridiano de Greenwich.

Cruzamos a ponte e margeamos o rio para contemplarmos o Parlamento de frente.

Santo Deus! Fixei meu olhar pelos céus para ter certeza de não estar vendo nenhum bruxo sobrevoando a região com sua vassoura mágica.

Constatei que os únicos bruxinhos por ali haviam vindo do Brasil e éramos nós. Estava muito frio pra mais alguém suportar ficar tão perto do rio.

Demorei para lavar o Tamisa com a quantidade perfeita de luz amarela para satisfazer meu ego fotográfico.

Andamos sem medo.
Andamos muito.
Andamos onde não ousaríamos andar.

Andei com o desejo de uma criança num parque.
Andei desplugado de aflições e fobias.
Andei maravilhado, abobalhado com tantas coisas belas, com tantas coisas construídas.

Eu havia me esquecido de como andar assim era bom.
Sorte minha me lembrar.

Esta noite flutuamos por uma Londres receptiva.
As pessoas eram amigáveis e mesmo com pressa, nos instruiam com educação e um baita sorriso no rosto.

Queríamos ir à famosa ponte.

Foi com esse objetivo que chegamos a Tower Hill.

A noite estava mais velha, nem por isso menos bela.
Um executivo apressado da minha idade nos ajudou com o caminho.

Era notável como as pessoas daquela cidade eram receptivas conosco.
Não sei se era o fato de estarmos com uma energia muito boa, mas não havia caras feias, pouco caso ou um “Sorry, I’m late”… Todos paravam para nos dar suporte, tiravam o mapa do metrô dos bolsos e caprichavam no sotaque.

Foi assim que a vimos pela primeira vez.
Ficamos petrificados.

De todas as pontes pelo Tâmisa, esta báscula era de longe a mais charmosa.
Suas torres lembravam fortes escoceses da Idade Média.

Contemplamos seu poder, sua arquitetura, sua força.

Em poucos minutos estávamos tomados pelo poder da torre.
Não era possível resistir aos seus encantos.

Foi assim que a Jussara tirou a foto mais perfeita de todas:

Infelizmente as fotos ainda não capturam pensamentos.

Ali, sobre aquele mármore frio, uma série de idéias pipocavam pela minha cabeça.
Quem chega ali, vindo da onde venho não consegue mais ser o mesmo.
É como se adquirissemos sabedoria.
O olhar muda, as verdades são outras, a perspectiva muda.

Quando se atinge um objetivo tão sagrado assim, parte-se pra uma nova etapa, pra um outro patamar.
Estar ali, sob aquele céu, sobre aquele chão tão cheio de história era estar atingindo outro nível.

Compreendi isso neste exato momento.

Cruzar o mundo provoca em mim pensamentos desse naipe.
A distância é um bom exercício pra alterar alguns ângulos internos.

Não há como ser o mesmo estando tão longe do nosso lar.

O mais legal nessa experiência é que eu não estava sozinho.

Ter alguém da família ao lado, tão próximo e tão diferente de vc faz toda a diferença.
Não sabia que minha irmã era tão boa companhia pra tamanha aventura.

Ela se mostrou firme, equilibrada, excelente guia metroviária, ótima tesoureira, companheira, topa tudo…

Puxava-me pro chão, pois flutuo com facilidade.

Ela é mais realista, mais econômica, mais focada…
Nem por isso menos dorminhoca, menos sonhadora e menos impressionada.

A gente literalmente esquecia de comer.
Íamos lembrar da barriga vazia lá pelas 18hs.

Fomos andando, contornando ruas cheias de pubs lindos com pessoas impecáveis. Tudo parecia uma grande praça de alimentação de shopping ao ar livre.

Eu não conseguia acreditar na qualidade de vida que aquele lugar apresentava.

Havia uma felicidade pós-trabalho penetrante no rosto daqueles executivos que bebiam suas cervejas nos tantos pubs espalhados pela região.
Cada pub era mais espetacular que o anterior. Me vi colecionando admiração para com as testeiras e logos de cada pub.
Não sou muito dependente do álcool, de modo que entrar ali e tomar umazinha fosse algo a me tentar. De qualquer forma, pensei em alguns momentos, se tivesse um pouquinho mais de tempo pra gastar, perderia umas horinhas ali…
Tudo bem, mais uma desculpa pra voltar.

Não demorou pra alcançarmos a região do City Hall.

O inusitado edifício, criado por Norman Foster, tem a forma de uma pilha de cds.
Ele consegue provocar na gente uma sensação bacana de física distorcida. É daqui que saem as grandes estratégias e novos projetos para a cidade.

Essa região, assim como a região da Millenium Bridge, podem ser conferidas no último filme do Harry Potter.
Passar por lá naquela hora da noite teve um gostinho mais mágico do que eu poderia desejar.

Contornamos o rio até encararmos a Tower Bridge de frente.
Foi como estar nas vésperas de atravessar um portal de História Sem Fim…
Tudo ali era cinematográfico.

Perdemos a noção dos nossos atos.

Já nem guardávamos mais o tripé na mochilinha. Andávamos com tudo montado.
Íamos encontrando casais apaixonados pela rua que se ofereciam para baterem fotos nossas.

Parávamos em todos os pontos para fazermos dezenas de fotos.

Andamos um bocado.
Conseguíamos ver do meio da ponte o tanto que tínhamos percorrido. E era muito!

Não estava mais frio.
As pernas nem doíam mais.
Não havia fome ou qualquer reclamação.
A adrenalina havia dominado todo o corpo.

Passar por aquele portal renovou todas as minhas energias.

Atravessamos a ponte.

Havia mais cidade pra se ver lá do outro lado. Swiss RE Building lá ao fundo!

Mas terminamos nossa aventura na primeira placa que encontramos.