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180- 05) Knights At Night

Já estávamos ficando familiarizados em descer na estação Westminster e encontrar aquela atmosfera amigável.

A escuridão deixava a cidade mágica.
Havia um convite irrecusável no ar.

Eu havia realmente me apaixonado pela cidade de Londres.
Andar por aquelas ruas caprichadas, com aquele vento gelando o rosto, compartilhando sonhos e admirações com os demais turistas que passavam boquiabertos pela nossa frente trazia liberdade, enchia o coração de uma felicidade que eu nunca havia sentido.

Eu já estava saudoso antes mesmo de ter minhas pegadas apagadas daquele chão.
Eu já sentia falta de Londres antes mesmo de deixá-la.

Captava sons, cheiros e luzes.
Caminhava por caminhos e passagens secretas que mexeriam com meus sonhos num futuro qualquer.

Ruas e túneis, escadarias e passarelas que mexiam com o meu labirinto e gravavam as mais fantásticas recordações no meu coração.

Não resistíamos ao Big Ben.
Já não era a primeira vez que subíamos as escadas da Westminster Tube Station e dávamos de cara com aquela enorme torre.
Já não era a primeira e muito menos a segunda vez e, ainda assim, sentíamos aquele adorável sentimento de descoberta, que faz a gente procurar o final da torre para encontrar os ponteiros precisos do famoso relógio.

Ficar pela região do rio era uma prova de fogo, ou melhor, de gelo!
Naquela hora da noite, daquele lado de lá, era preciso ter sangue quente, ou melhor, frio, para suportar ou se fingir de sapo.
Enfrentar aquela gélida corrente de ar que por ali existia não era tarefa para muitos cavaleiros.

Parar no meio da Ponte de Westminster e ter um momento de reflexão, do que tudo isso significa, do quanto estamos distantes de casa, do tanto que lutamos por este momento, mesmo sem saber que ele seria tão especial… É algo que mesmo agora, do lado de fora da foto, sentado em minha velha cadeira, digitando aqui nesse computador, eu não poderia compreender.
É tão completa a experiência em fazer parte de um lugar tão importante e ao mesmo tempo tão gigante que por um momento me perco em pensamentos indescritíveis.

Estava eu ali, olhando para mim mesmo e nem havia me dado conta!
Claro que eu não me enxergava.
Mas óbvio que eu me vejo agora.

Somos tão pequenos e frágeis se comparados ao concreto e aos tijolos que recheiam e envolvem todas essas estruturas, ao mesmo tempo que somos tão capazes de modelá-las a nossa vontade.
Somos gigantes quando estamos fora da foto, olhando por cima algo que ficou no passado.

Nem havia me tocado que o ambiente atrás de mim havia mudado suas luzes para se adequar a minha vibração colorida.

Uma pequena fração de cores similares.

Um segundo atrás estava com cores similares. No outro, já havia mudado.

Olhamos para a London Eye com respeito.
Tem coisas que os homens constróem e tiram o nosso fôlego.
Essa era uma delas.

Refletida no Tamisa, a London Eye ou o Olho de Londres era ainda mais bela. Uma declaração luminosa aos nossos desprotegidos olhos gelados.
Certamente subiríamos nela no dia seguinte não fosse pela nossa úmida aventura pelo Meridiano de Greenwich.

Cruzamos a ponte e margeamos o rio para contemplarmos o Parlamento de frente.

Santo Deus! Fixei meu olhar pelos céus para ter certeza de não estar vendo nenhum bruxo sobrevoando a região com sua vassoura mágica.

Constatei que os únicos bruxinhos por ali haviam vindo do Brasil e éramos nós. Estava muito frio pra mais alguém suportar ficar tão perto do rio.

Demorei para lavar o Tamisa com a quantidade perfeita de luz amarela para satisfazer meu ego fotográfico.

Andamos sem medo.
Andamos muito.
Andamos onde não ousaríamos andar.

Andei com o desejo de uma criança num parque.
Andei desplugado de aflições e fobias.
Andei maravilhado, abobalhado com tantas coisas belas, com tantas coisas construídas.

Eu havia me esquecido de como andar assim era bom.
Sorte minha me lembrar.

Esta noite flutuamos por uma Londres receptiva.
As pessoas eram amigáveis e mesmo com pressa, nos instruiam com educação e um baita sorriso no rosto.

Queríamos ir à famosa ponte.

Foi com esse objetivo que chegamos a Tower Hill.

A noite estava mais velha, nem por isso menos bela.
Um executivo apressado da minha idade nos ajudou com o caminho.

Era notável como as pessoas daquela cidade eram receptivas conosco.
Não sei se era o fato de estarmos com uma energia muito boa, mas não havia caras feias, pouco caso ou um “Sorry, I’m late”… Todos paravam para nos dar suporte, tiravam o mapa do metrô dos bolsos e caprichavam no sotaque.

Foi assim que a vimos pela primeira vez.
Ficamos petrificados.

De todas as pontes pelo Tâmisa, esta báscula era de longe a mais charmosa.
Suas torres lembravam fortes escoceses da Idade Média.

Contemplamos seu poder, sua arquitetura, sua força.

Em poucos minutos estávamos tomados pelo poder da torre.
Não era possível resistir aos seus encantos.

Foi assim que a Jussara tirou a foto mais perfeita de todas:

Infelizmente as fotos ainda não capturam pensamentos.

Ali, sobre aquele mármore frio, uma série de idéias pipocavam pela minha cabeça.
Quem chega ali, vindo da onde venho não consegue mais ser o mesmo.
É como se adquirissemos sabedoria.
O olhar muda, as verdades são outras, a perspectiva muda.

Quando se atinge um objetivo tão sagrado assim, parte-se pra uma nova etapa, pra um outro patamar.
Estar ali, sob aquele céu, sobre aquele chão tão cheio de história era estar atingindo outro nível.

Compreendi isso neste exato momento.

Cruzar o mundo provoca em mim pensamentos desse naipe.
A distância é um bom exercício pra alterar alguns ângulos internos.

Não há como ser o mesmo estando tão longe do nosso lar.

O mais legal nessa experiência é que eu não estava sozinho.

Ter alguém da família ao lado, tão próximo e tão diferente de vc faz toda a diferença.
Não sabia que minha irmã era tão boa companhia pra tamanha aventura.

Ela se mostrou firme, equilibrada, excelente guia metroviária, ótima tesoureira, companheira, topa tudo…

Puxava-me pro chão, pois flutuo com facilidade.

Ela é mais realista, mais econômica, mais focada…
Nem por isso menos dorminhoca, menos sonhadora e menos impressionada.

A gente literalmente esquecia de comer.
Íamos lembrar da barriga vazia lá pelas 18hs.

Fomos andando, contornando ruas cheias de pubs lindos com pessoas impecáveis. Tudo parecia uma grande praça de alimentação de shopping ao ar livre.

Eu não conseguia acreditar na qualidade de vida que aquele lugar apresentava.

Havia uma felicidade pós-trabalho penetrante no rosto daqueles executivos que bebiam suas cervejas nos tantos pubs espalhados pela região.
Cada pub era mais espetacular que o anterior. Me vi colecionando admiração para com as testeiras e logos de cada pub.
Não sou muito dependente do álcool, de modo que entrar ali e tomar umazinha fosse algo a me tentar. De qualquer forma, pensei em alguns momentos, se tivesse um pouquinho mais de tempo pra gastar, perderia umas horinhas ali…
Tudo bem, mais uma desculpa pra voltar.

Não demorou pra alcançarmos a região do City Hall.

O inusitado edifício, criado por Norman Foster, tem a forma de uma pilha de cds.
Ele consegue provocar na gente uma sensação bacana de física distorcida. É daqui que saem as grandes estratégias e novos projetos para a cidade.

Essa região, assim como a região da Millenium Bridge, podem ser conferidas no último filme do Harry Potter.
Passar por lá naquela hora da noite teve um gostinho mais mágico do que eu poderia desejar.

Contornamos o rio até encararmos a Tower Bridge de frente.
Foi como estar nas vésperas de atravessar um portal de História Sem Fim…
Tudo ali era cinematográfico.

Perdemos a noção dos nossos atos.

Já nem guardávamos mais o tripé na mochilinha. Andávamos com tudo montado.
Íamos encontrando casais apaixonados pela rua que se ofereciam para baterem fotos nossas.

Parávamos em todos os pontos para fazermos dezenas de fotos.

Andamos um bocado.
Conseguíamos ver do meio da ponte o tanto que tínhamos percorrido. E era muito!

Não estava mais frio.
As pernas nem doíam mais.
Não havia fome ou qualquer reclamação.
A adrenalina havia dominado todo o corpo.

Passar por aquele portal renovou todas as minhas energias.

Atravessamos a ponte.

Havia mais cidade pra se ver lá do outro lado. Swiss RE Building lá ao fundo!

Mas terminamos nossa aventura na primeira placa que encontramos.